Ensaio curto de uma quase recaída da qual em 30 minutos já me levantei



Fico vendo o cursor piscar nessa caixa branca. Mil coisas na cabeça, a memória dos diálogos raros e às vezes inteligentes, dos sinais e marcas desenhados como pintura na pele, dos cheiros (nem sempre bons), da solidão acompanhada que era estar na companhia dele. Tanto a digitar e tão pouco o que posso de fato deixar aqui. Esse blog é um pouco como o banheiro do trabalho, onde a gente se tranca e chora, soluça em silêncio, mas que antes de abrir a porta a gente ri na frente do espelho com os olhos vermelhos, como um Coringa assalariado que quer encobrir os sinais do choro.

O que dizer sem me comprometer demais? Penso em falar sobre como relacionamentos longos podem ser celas cômodas, ou sobre como a Lei da Inércia atinge a mim mais do que aos outros indivíduos ou até sobre a rigidez racista, gordofóbica e comercial do padrão de beleza ocidental e cada vez mais universal. Não vou discorrer sobre nada disso. Não é novidade. Seria como escrever um estudo científico sem qualquer mérito ou contribuição. Seria um pouco como eu, redundante, estável e previsível. A figurinha repetida de um time que perdeu em um álbum de Copa que já passou.

Antes era eu e ele contra o mundo, e agora não é que seja ele e o mundo contra mim, mas ele e o mundo de costas pra mim - o primeiro me esnobando e o segundo sem nem ao menos me conhecer. Não paro de pensar na quantidade de coisas que deixei de viver com o mundo para (sobre)viver com ele. 17 anos... Tem arrependimento aqui sim, que conversa ridícula essa de que "foi bom enquanto durou". E aí me forço a lembrar do mau hálito dele, do cabeção, do temperamento vaidoso, do silêncio constante e pretensioso. Foi melhor assim, vou tentando me convencer. Bem melhor assim.

Esse post é só um ensaio curto de uma quase recaída da qual em 30 minutos já me levantei. Vou concluindo o quarto parágrafo, me dirigindo para a conclusão e pensando que esse texto é só mais um pouco de tempo perdido, e quanto tempo já perdi! Mas não vou encerrar o texto sem antes lembrar que, recebendo um pouco mais de afeto, teria convivido tranquila com o bafo, o cabeção e o temperamento. Previsível. Eu sei disso, o mundo sabe, ele sabe. É que, em matéria de amor, talvez eu me contente com pouco. Eu teria ficado. Só que a conta ainda não fecha quando um quer pouco e o outro não dá nada.

Ele ainda vai se arrepender, eu sei, e o amargor do arrependimento vai se fundir com aquela halitose. E nessas ocasiões eu me certificarei de estar sempre a uma distância segura. Nunca mais, repito pra mim mesma. Nunca mais. Ponto.

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